A evolução tecnológica na educação: dos primórdios aos dias de hoje

Muito tem sido comentado sobre a necessidade de preparar os estudantes de hoje para a sociedade do conhecimento de “amanhã”, uma sociedade na qual a compreensão conceitual e a geração de novas ideias e narrativas predominam e são soberanas. Isso envolve, também, a evolução tecnológica na educação. Numa perspectiva antropológica, pode-se afirmar que os humanos sempre viveram em sociedades do conhecimento, pois, como seres sencientes, adaptam-se e avançam, tornando-se aprendizes incansáveis. Sua capacidade para criar e pensar criticamente possibilitou a nossa sobrevivência em diversos tipos de ambientes, inclusive os hostis.

Na Idade Média, a educação era praticada principalmente nos monastérios. Somente os nobres e intelectuais da época tinham direito a aprender. Surge então, a educação 1.0. Esse tipo de escola era focado em um método de ensino tradicional, com objetivo de desenvolver um conhecimento básico, tanto de conteúdo quanto de comportamento. O professor repassava todo o conhecimento e o aluno apenas escutava, não tendo o direito de participar nem de expor suas opiniões. Nesse modelo, o sistema de aprendizado era baseado em escutar o professor, anotar e estudar os textos lidos em aula e em reproduzir análises e pensamentos iguais ao dos outros alunos. Também entrava nesse modelo o ensino doméstico conduzido por pais ou familiares (pessoas que não tinham, necessariamente, educação formal para o ensino e que compartilhavam o conhecimento advindo de livros com a crença de que memorização e repetição significavam eficiência de aprendizado).

Já a metade do século XVIII foi marcada por grande desenvolvimento tecnológico que teve início na Inglaterra e se espalhou pelo mundo, causando grandes transformações. Foi a chamada Revolução Industrial, período em que as máquinas e o trabalho assalariado exigiram novas habilidades da sociedade, e, consequentemente, dos estudantes. Nessa época, todos tinham direito à educação. Na escola 2.0, a sala de aula era parecida com o dia a dia de uma indústria, com tarefas mecânicas e repetidas, trabalho individual e alunos sentados em fileiras. Por muitos anos, essa escola atendeu as necessidades da sociedade. Os estudantes eram preparados apenas para obedecer às regras e trabalhar nas fábricas. Embora a sociedade tenha evoluído, o modelo 2.0 ainda é o mais usual em diversas partes do mundo. Nessa perspectiva de ensino, o conhecimento é centralizado no professor e o aluno é visto como um observador passivo ou como um “receptor vazio” no qual o professor “despeja” conteúdo.

No entanto, com a chegada da internet e da globalização no século XX e com o crescimento tecnológico-digital exponencial do século XXI a educação mudou consideravelmente, dando espaço a um novo modelo focado na criatividade, inovação e trabalho em grupo. A essa transformação, deu-se o nome de escola 3.0¹, representando a terceira geração da educação, a qual prepara alunos para o sucesso no mercado de trabalho altamente tecnológico.

O fácil acesso à informação, através da tecnologia e da internet, transformou o modo de ensinar e aprender: alunos, professores e escolas participam juntos no processo de aprendizagem. Nessa educação, o professor acolhe o (a) aluno (a), incentivando-o a expor suas vontades, dúvidas e opiniões sobre o mundo, tornando-a muito diferente da educação 2.0, em que os alunos se tornavam repositórios de conteúdo e informação.

Na escola 3.0, educadores e estudantes trabalham juntos para construir o ensino, utilizando exemplos da vida real através de diferentes tecnologias como vídeos, podcasts e redes sociais. Dentre os principais pilares que embasam essa escola, temos: a integração entre as matérias; a colaboração entre alunos e professores; a construção do saber através da participação de todos; o protagonismo e o papel ativo do aluno; o desenvolvimento do senso crítico; a capacidade de trabalhar em equipe e de resolver problemas do mundo real (soft skills) e a compreensão a respeito das múltiplas inteligências propostas por Gardner (1983) que possibilitam customização e personalização do ensino.

Nessa perspectiva de escola, as redes sociais e as novas tecnologias ajudam a tornar as aulas mais interessantes e atuais. Para dar uma aula de qualidade, visto que o uso de tecnologias se torna essencial, o professor terá que entender como esses dispositivos funcionam, e qual o seu papel na sociedade.

Atualmente, estamos observando a inserção, ainda que tímida, de aspectos tecnológicos ligados à educação 4.0 e educação 5.0. Isso não significa dizer, entretanto, que muitas características da educação 3.0 fiquem obsoletas do dia para a noite. Elas ainda continuarão a existir por um bom tempo, pois englobam algumas particularidades dos chamados soft skills mencionados acima, muito difundidos entre os recrutadores no atual mercado de trabalho.

Ao voltarmos para a história dessa evolução, veremos que o desenvolvimento e a expressão do conhecimento humano experimentaram dois grandes períodos disruptivos: o primeiro, com a invenção da prensa de impressão e o segundo, com o surgimento da eletricidade (MAGANA, 2017). Segundo o autor, essa nova era digital possibilitará um crescimento exponencial de uma rede de saberes interdependente e globalmente conectada, que contribuirá com novos conceitos e noções do conhecimento e pensamento humanos. Dessa forma, podemos pensar que parte daquilo que faz os humanos se sobressaírem é sua capacidade extraordinária de desenvolver e aplicar tecnologias disruptivas, não apenas para tornar suas vidas mais fáceis e melhores, mas também para acumular conhecimento para as futuras gerações.

Mas, afinal, o que significa a palavra disruptiva no contexto tecnológico? A expressão “inovação disruptiva” foi criada por Bower e Christensen (1995) para definir tecnologias capazes de transformar por completo o setor de uma empresa. No caso da educação, transformar paradigmas, crenças, tendências. O conceito adotado neste artigo é o de mudar a forma como os ambientes educacionais lidam com as tecnologias, para que estas possam agregar alto valor na vida de estudantes e professores. Tecnologias inovadoras disruptivas são acessíveis, intuitivas e autoexplicativas. De modo particular, descreve uma nova maneira de pensar o ensino por meio da integração de princípios pedagógicos e tecnológicos efetivos que elevem as práticas educacionais e maximizem o aprendizado de alunos das gerações digitais, particularmente as conhecidas como a Geração Y (Old e Young Millenials)², que hoje têm entre 18 e 34 anos de idade. Numa perspectiva mais ampla, insere alunos dessa faixa etária nas chamadas Revolução 4.0 e Revolução 5.0, ligadas à revolução tecnológica que inclui linguagem computacional, inteligência artificial, Internet das coisas, e contempla a aprendizagem por meio da experimentação, de projetos e vivências bem como as habilidades cognitivas, a empatia e a conscientização socioambiental.

A web 4.0, chamada de web simbiótica, é que os computadores e os humanos começam a interagir. Na educação, chamada então de educação 4.0, os alunos devem se transformar em pessoas capazes de inovar e gerenciar a tecnologia. Mas não é só isso, eles precisam desenvolver, mais amplamente, habilidades socioemocionais (soft skills) para serem capazes de melhorar a sociedade onde vivem. O ensino que já é ou deveria ser personalizado conta com uma aliada importante, a inteligência artificial, que aumenta a alcançabilidade de customização e personalização porque se apoia, entre outras coisas, em datawise e em automatização de feedback, por exemplo. Os sistemas começam a entender onde os alunos estão inseridos e a ideia é que estes façam, participem, conheçam, aprendam, explorem e criem.

Por fim, chegamos à Web 5.0 e à educação 5.0, que foram inspiradas pela Sociedade 5.0, cuja origem se deu no Japão e 2016. A ideia lançada foi a de usar a tecnologia não apenas para aumentar a produção, mas também para oferecer mais qualidade de vida e ações relevantes para a sociedade. Nesse sentido, a tecnologia começou a ser utilizada de forma produtiva e com o intuito de criar situações e produções tecnológicas para transformarem a realidade de algumas pessoas e comunidades, principalmente diante da pandemia. Entra em cena, então, o protagonismo social, em que pensar no bem comum e desenvolver a empatia se tornaram fundamentais. Essa é a grande mudança que devemos vivenciar a partir de agora.

Referências:

Bower, J. L., & Christensen, C. M. Disruptive Technologies: catching the wave. Harvard Business Review, 1995.
Dearo, Guilherme. Existem dois tipos de millennials e eles são muito diferentes. Revista Exame. São Paulo, 2017.
Gardner, Howard. Estruturas da Mente: a Teoria das Inteligências Múltiplas. São Paulo: Editora Artes Médicas, 1983.
Magana, Sonny. Disruptive Classroom Technologies: a framework for innovation in Education (English Edition). London: Sage Publications Ltd. 2017.
Lengel, James. Education 3.0: Seven Steps to Better Schools. New York: Teachers College Press, 2012.

¹ Termo cunhado por James Lengel (Lengel, 2012).

² Mais precisamente, os young millenials têm entre 18 e 24 anos e os old millenials, entre 25 e 34 anos. Fonte: http://exame.abril.com.br/marketing/existem-dois-tipos-millennials-muito-diferentes/

Heloísa Delgado. Tradutora e educadora de formação e coração, sua trajetória está relacionada ao ensino da língua inglesa e da tradução, tendo atuado nos cursos de extensão, graduação e pós-graduação lato sensu na PUCRS por 30 anos.

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Asafe Cortina. Professor da Escola de Humanidades da PUCRS (Letras-inglês), professor de língua inglesa no Colégio Israelita Brasileiro (CIB) e tradutor simultâneo de inglês, português e espanhol.

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